Um dos processos mais caros, burocráticos e, por vezes, controversos para o cidadão brasileiro pode estar prestes a sofrer sua mais radical transformação em décadas. O Governo Federal, com o aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, está avançando com uma proposta que prevê o fim da obrigatoriedade de frequência em autoescolas para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
O projeto, que será colocado em consulta pública nos próximos dias pela Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), tem como objetivo principal baratear e desburocratizar o acesso à habilitação.
Segundo as primeiras apurações, a vontade política para levar a medida adiante é forte, e as chances de que o projeto se torne realidade são consideradas altas nos bastidores do governo.
A Proposta: O que Realmente Vai Mudar?
A mudança central do projeto é o fim da exigência de uma carga horária mínima de aulas para poder realizar os exames. Atualmente, a legislação obriga o candidato a cumprir 40 horas de aulas teóricas e 20 horas de aulas práticas em um Centro de Formação de Condutores (CFC).
Com a nova regra, o candidato teria a liberdade de escolher se quer ou não fazer aulas, e quantas. A formação se tornaria opcional, permitindo que a pessoa se prepare por conta própria para a prova teórica e pratique a direção com instrutores credenciados antes de ir para o exame prático.
As autoescolas (CFCs) não deixariam de existir, mas passariam a atuar em um modelo de livre concorrência, tendo que provar o valor de seu serviço. Além delas, a proposta prevê a criação da figura do “instrutor autônomo”, que seria credenciado pelos Detrans e poderia oferecer aulas de forma independente.
O Objetivo do Governo: Regularização em Massa e Redução de Custos
A motivação do governo para uma mudança tão profunda é dupla.
O primeiro e mais impactante objetivo é a redução drástica no custo para tirar a CNH. A expectativa é que o valor médio do processo, que hoje gira em torno de R$ 3.000, possa cair para cerca de R$ 600 – uma redução de 80%. A medida visa ampliar o acesso à habilitação para a população de baixa renda.
O segundo objetivo é a regularização em massa. O governo reconhece que milhões de brasileiros já dirigem sem habilitação, muitas vezes por não terem condições de arcar com os custos do processo. A proposta permitiria que esses motoristas experientes, mas não habilitados, pudessem ir diretamente para as provas e regularizar sua situação.
Como Fica a Segurança no Trânsito?
A questão mais polêmica em torno do fim da obrigatoriedade de autoescolas é o potencial impacto na segurança viária.
O Ministério dos Transportes argumenta que a segurança não será prejudicada, pois os exames teórico e prático continuarão sendo rigorosos e obrigatórios para todos. Além disso, a proposta mantém a exigência de que qualquer aula prática seja ministrada por um instrutor habilitado.
Críticos da medida, no entanto, temem que a ausência de uma formação teórica e prática padronizada possa resultar em novos motoristas menos preparados para as complexidades e os perigos do trânsito.
O Rito Burocrático: A Medida Precisa do Congresso?
Um ponto crucial da proposta é a sua forma de implementação. Com base no artigo 141 do Código de Trânsito Brasileiro, o governo avalia que as mudanças podem ser feitas através de uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) ou por decreto, o que dispensaria a necessidade de uma longa tramitação e aprovação no Congresso Nacional.
Antes de qualquer decisão, o texto será submetido a uma consulta pública, onde a sociedade civil, especialistas e entidades do setor poderão enviar suas críticas e sugestões.
Conclusão: Uma Mudança Paradigmática no Horizonte
A proposta para o fim da obrigatoriedade de autoescolas é, sem dúvida, a mais profunda já considerada para o processo de formação de condutores no Brasil.
De um lado, ela carrega a promessa de democratizar o acesso a um documento essencial para o trabalho e a cidadania de milhões de pessoas. Do outro, levanta um debate necessário sobre a qualidade da formação dos novos motoristas.
O resultado da consulta pública e a versão final do texto serão decisivos para o futuro do trânsito no país. O que é certo é que uma mudança de paradigma está no horizonte, e ela tem o potencial de redefinir completamente como os brasileiros aprendem a dirigir.